da REGIONAL CAMPINAS
Para inverter a lógica perversa de que primeiro ocorrem os acidentes/contaminações e depois são feitas tentativas de responsabilizar as empresas causadoras e os trabalhadores lesionados precisarem provar que são vítimas e não os culpados, um projeto de iniciativa de professores e doutores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) de Botucatu foi apresentado na manhã de hoje (13/outubro/11) na Regional Campinas do Sindicato Químicos Unificados. O Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (Cerest) de Campinas é uma das instituições que apoiam a natureza e objetivos do projeto e agem para seu desenvolvimento e fortalecimento.
Foram palestrantes Dr. Marcos Oliveira Sabino (foto acima), médico sanitarista do Cerest/Campinas, o professor Rodolfo Andrade Gouveia Vilela, da Faculdade de Saúde Pública da USP e o professor doutor Ildeberto Muniz de Almeida, da disciplina de Medicina do Trabalho do Departamento de Saúde Pública Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp).
Participaram do seminário dirigentes do Unificados, a Associação dos Trabalhadores Expostos a Substâncias Químicas (Atesq) e ex-trabalhadores da Shell Brasil e da Basf S.A., causadoras do crime de contaminação ambiental e humano no bairro Recantos dos Pássaros, em Paulínia/SP.
O crime ambiental Shell/Basf é um dos destaques nos estudos para a construção deste projeto, que não é específico sobre os processos contra estas duas multinacionais, mas, sim, por exemplo, no caminho da produção de um termo de ajuste de conduta (TAC) a ser aplicado em casos assemelhados em todo o país.
[Download não encontrado.] para ler um resumo do projeto.
De saída, a culpa é do trabalhador
Hoje, quando ocorre um acidente/contaminação do trabalho, parte-se do pressuposto de que o trabalhador é o responsável pelo fato, de que houve imperícia ou irresponsabilidade de sua parte. Este discurso (e falsa realidade) foi construído ao longo dos anos e está gravado no senso comum da população, da mídia, dos próprios trabalhadores e também do Poder Judiciário que, em última instância, irá julgar as causas e determinar responsabilizações.
Assim, cabe sempre ao trabalhador provar que foi vítima, lutar por tratamento de saúde junto ao Sistema Único de Saúde (SUS) e, se for o caso, garantir uma indenização mínima. As empresas já gozam da premissa inicial de que são sérias, consequentes, profissionais e preocupadas com o bem estar de seus trabalhadores. Tanto que os chama de colaboradores, e não mais trabalhadores, o que realmente são.
Conhecer, antecipar, prevenir
O projeto que agora se inicia tem o objetivo de dar um salto de qualidade, de inverter esta lógica. Ele busca que o trabalhador venha a ser agente ativo na defesa de sua saúde, de fiscalização das condições de trabalho, detentor de poder para exigir segurança.
Para isto nos processos em que empresas são condenadas, parte da verba seria destinada exclusivamente para promover informações, esclarecimentos da condições de trabalho diretamente ao trabalhadores, em programas também organizados e ministrados por eles. Isto, sem prejuízo das demais condenações como ressarcimento das vítimas, indenizações individuais e coletivas, multas e inclusive construções de hospitais.
Assim, também seria superado um problema que o atual modelo leva ao conjunto, ao interesse coletivo dos trabalhadores. Como as penas de indenizações são individualizadas, isto leva a que interesses individuais se sobreponham ao interesse de todos, dividindo assim a capacidade de luta e de pressão.
Romper cruel ciclo econômico: empresas/judiciário >>>FAT>>>BNDES>>>empresas
Outro objetivo do projeto é romper um cruel ciclo que existe hoje quando as empresas responsáveis por danos em acidentes/contaminações são condenadas a pagar altas multas.
Hoje, de rotina praticamente cristalizada, o Poder Judiciário condena as empresas a recolherem as multas para o Fundo de Apoio ao Trabalhador (FAT). O FAT, por sua vez, repassa dinheiro ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que, também por sua vez, com juros baixíssimos e a longo prazo financiam empréstimos às empresas. Ou seja, a empresa causa acidente/contaminação, é condenada, paga e praticamente recebe o valor de volta, via BNDES.
O projeto visa, também que os trabalhadores, e a sociedade, tenham ativa participação e poder de decisão sobre os financiamentos feitos pelo BNDES pois, na verdade, isso é feito com dinheiro público.