Gilmar Mauro (foto) , com 41 anos, é membro da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), no qual entrou em 1985. A prioridade de sua ação no movimento são as áreas de formação e mobilização, notadamente no estado de São Paulo.
Para falar sobre o bom combate travado pelo MST, que é reconhecido internacionalmente, e sobre a atual Jornada de Lutas por Reforma Agrária (veja na página 7), realizada em torno do Dia do Trabalhador Rural, que é 25 de julho, o jornal do Unificados entrevistou Gilmar Mauro.
Gilmar Mauro coloca bandeira do MST em janela na
sede do movimento, em São Paulo (Foto: Folha Imagem)
A ENTREVISTA
850 milhões com fome
Jornal do Unificados – Os movimentos sociais falam em “ocupação” de terras e a mídia (rádios, TVs e jornais) as trata como “invasões”. Por que isso?
Gilmar Mauro – Isso é feito com o objetivo de estigmatizar, de criar uma marca negativa nos movimentos sociais. Para o senso comum, para o entendimento médio da população, “invadir” remete a entrar violentamente em uma propriedade, que poderia ser inclusive uma residência. No entanto, os Estados Unidos invadem o Iraque e o fato é noticiado como “ocupação”. Ou seja, a mídia busca construir uma imagem negativa sobre os que lutam por seus direitos.
Jornal do Unificados – Hoje, além da luta pela reforma agrária, o MST estende suas ações sobre o agronegócio e empresas tidas como produtivas, o que aumenta o ataque da mídia sobre o movimento. Por quê essa mudança?
Gilmar Mauro – A Constituição brasileira exige que a terra cumpra uma função social, que produza em benefício de todos. E que por transgressões às legislações trabalhista e ambiental ela pode ser desapropriada. Até hoje, somente uma área foi desapropriada por ferir leis trabalhistas e nenhuma por infração ambiental. O agronegócio é constituído de monocultura, com o uso de grande quantidade de veneno, o que destrói o meio ambiente. Um pé de eucalipto, exemplo de monocultura, consome cerca de 30 litros d’água por dia. Quando exportamos eucalipto, exportamos água!
Jornal do Unificados – Como o MST vê a questão alteração genética nos alimentos, os chamados transgênicos?
Gilmar Mauro – O MST não é contrário à pesquisa. O movimento é favorável ao desenvolvimento, desde que ele tenha como objetivo o benefício de toda a população, de todos os trabalhadores, e que respeite a vida e o planeta. Não há ainda estudos suficientes que garantam que não há danos com os transgênicos, mas já há casos de alergias registradas pelo seu uso. Outra questão é a patente, a propriedade privada sobre as sementes. As sementes estão na natureza há milhares de anos. Geneticamente modificadas, as sementes se tornam fonte de muito lucro, pois, para plantar, os agricultores ficam obrigados a comprá-las das grandes multinacionais que as produzem.
Jornal do Unificados – A pequena agricultura, que seria o fruto de uma reforma agrária, teria qual papel em um mundo que carece da produção massiva de alimentos?
Gilmar Mauro – Com a reforma agrária, com as grandes propriedades divididas, haverá mudanças no modelo agrícola, a construção de cooperativas, e a produção planejada com prioridade para a alimentação.
Jornal do Unificados – O MST critica a alternativa álcool de cana como fonte de energia. Por quê?
Gilmar Mauro – O MST não tem qualquer problema com o álcool enquanto fonte alternativa de energia. O problema é a monocultura da cana com objetivos exportadores. A lavoura ficará entupida de cana, com muito agrotóxico a poluir a terra, as águas e o ar. De forma planejada e com respeito aos seres humanos, à cultura para alimentação e ao meio ambiente, a alternativa álcool como fonte de energia terá sim o apoio do MST.
Jornal do Unificados – Por que subiram tanto os preços dos alimentos?
Gilmar Mauro – A especulação capitalista na Bolsa de Mercadorias & Futuro (BM&F) é a grande responsável pela alta nos preços dos produtos alimentícios em todo o mundo, e não por que o povo está comendo mais, como disse o presidente Lula. Com a quebra do setor imobiliário nos Estados Unidos, os especuladores se mudaram para a BM&F e, por meio de commodities, já negociaram até mesmo as safras de alimentos de 2012… 2015. Já está tudo negociado, sete oito anos à frente. Com esta exploração os capitalistas acumulam grandes lucros e levam à necessidade e à fome absoluta milhões de pessoas. No mundo, cerca de 850 milhões de pessoas passam fome diariamente enquanto os capitalistas acumulam riquezas com a especulação sobre os alimentos.