Há 28 anos, em meados de abril de 1984, o Brasil viveu uma de suas maiores mobilizações sociais, o movimento pelas Diretas-Já!, que segundo estimativas reuniu 1,5 milhão de pessoas no centro de São Paulo.
O movimento contou com a intensa participação de movimentos sociais, sindicais, políticos, da classe artística, e até esportistas, como o falecido jogador Sócrates, entrevistado pelo Jornal do Unificados em agosto de 2010.
Apesar das enormes manifestações, com intensa participação popular, o Jornal Nacional, da Rede Globo, noticiou o movimento como a comemoração do aniversário da cidade de São Paulo. Poucos dias depois, a proposta de eleições diretas foi derrotada no Congresso, e o presidente do Brasil foi escolhido por eleições indiretas.
Esse é só um exemplo de manipulação da informação por um grande veículo de mídia no Brasil. Existem muitos outros.
A informação tem dono
Segundo o livro A Ditadura da Mídia, do jornalista Altamiro Borges, hoje, somente cinco famílias, donas de grandes grupos, dominam toda a comunicação no país.
O mesmo livro afirma que as Organizações Globo têm uma enorme hegemonia no setor.
São 35 grupos afiliados que controlam, ao todo, 340 veículos. A relação com empresas em todos os estados permite que o conteúdo gerado pelos 69 veículos próprios do grupo carioca seja distribuído por um sistema que inclui 33 jornais, 52 rádios AM, 76 rádios FM, 11 rádios OC, 105 emissoras de TV, 27 revistas e 17 canais e nove operadoras de TV paga. Além disso, a penetração de sua rede é reforçada por um sistema que inclui 3.305 retransmissoras.
Para falar sobre esse tema o Jornal do Unificados entrevistou o ex-metalúrgico, escritor e um dos fundadores do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC – http://www.piratininga.org.br/), Vito Giannotti (foto acima).
ENTREVISTA
Essa mídia não é neutra. Ela tem um lado: o lado da classe dominante
Jornal do Unificados – Qual é a importância da mídia na formação da opinião pública, na forma com que a população vê e entende os fatos sociais?
Vito Giannotti – Eu prefiro falar de ideologia dominante ao invés de opinião pública. Podemos falar de opinião dominante, ou seja, a opinião da maioria. Esta não nasce do nada. Ela é criada pelos fatos. E quem é que define o que é ou não um fato? O que é uma notícia que merece ser levada ao conhecimento do público? Aí já começa a formação de opinião. E quem relata o fato é a mídia: rádios, TVs, jornais, revistas e, hoje a internet. E essa mídia não é neutra. Ela tem um lado: o lado da classe dominante.
Jornal do Unificados – A mídia deveria apresentar imparcialmente todas as versões de um fato para que cada leitor tirasse suas conclusões. É isso que ocorre? A mídia é imparcial?
Vito Giannotti – Isso é papo furado de quem não leva em conta que a sociedade é dividida em classes. Não existe A mídia, uma mídia só… Existem duas mídias. A mídia da classe patronal. A mídia comercial, empresarial, burguesa. A mídia deles.
A mídia dos inimigos da classe trabalhadora. Desgraçadamente, esta é muito forte. Tão forte quanto o capital que eles têm, quanto o poder que os patrões, que nós chamamos de burguesia têm. E existe a nossa mídia que infelizmente é fraca, magrelinha, absolutamente insuficiente. A mídia deles não tem obrigação nenhuma com a verdade, com a neutralidade, a imparcialidade. Ela tem dono, E dono tem classe e classe tem interesse de classe. Qual classe? A deles, evidentemente.
Então nada de acreditar em Papai Noel. A mídia deles é nossa inimiga e ponto. Só nos resta a nossa.
Jornal do Unificados – Como é hoje a comunicação dos sindicatos e dos movimentos populares com a sociedade?
Vito Giannotti – Insuficiente. Podemos fazer muito mais. Iludimo-nos com um jornalzinho uma vez por mês e um discurso aqui e acolá. Enquanto isso nosso inimigo faz suas novelas, seus programas policiais em rádios e televisão. Seus telejornais e seus Fantásticos. A gente se ilude e se contenta com migalhas. Precisamos avançar muitíssimo na batalha da construção da nossa mídia alternativa. Juntar esforços. Criar novas realidades e ir pra cima dos governos para exigir passos concretos de democratização da mídia. E garantir condições da população criar e manter sua própria mídia, com dinheiro público, tanto quanto a escola deve ser pública, os transportes e por aí vai. Exigir dos donos da política uma virada total no campo das comunicações. Mas isso só se consegue com força política da nossa classe. Com partido, sindicatos e toda forma de associação comprometidos verdadeiramente com os interesses da maioria, com os interesses dos trabalhadores. Esta é uma luta de 10, 20, 50 anos. É a luta para construir uma sociedade socialista, totalmente diferente desta aqui de hoje.
Jornal do Unificados – Esse ano é ano de eleição. Você acha que a mídia pode influenciar no resultado? O que você espera dos veículos de comunicação nas eleições 2012?
Vito Giannotti – Claro que a mídia influencia qualquer eleição. A mídia patronal continua a fazer seu trabalho, como sempre.
Nesta época, dirige suas ações para ter um resultado eleitoral favorável à sua classe. Como sempre. É a lógica do sistema. Quem não lembra como a Globo manipulou o último debate entre Lula e Collor, em 1989?
A classe trabalhadora precisa aproveitar este momento para apresentar suas alternativas. Mostrar qual sociedade quer construir. Aproveitar o momento para propagandear suas ideias, suas proposta para avançar rumo a uma sociedade justa com uma verdadeira democracia.
Jornal do Unificados – As novas tecnologias da informação, principalmente a internet, podem ser consideradas uma porta para a democratização dos meios de comunicação?
Vito Giannotti – Sim, sem dúvida. Mas, atenção. 60% do nosso povo não vão acessar estas novas tecnologias nos próximos 30 anos. Por quê? Simples, porque temos 60% do povo na faixa entre analfabeta total e analfabeta funcional, isto é, que sabe ler duas linhas, mas não entende o que leu, não sabe juntar o sentido das palavras.
A internet proporciona, sim, uma maior circulação das informações, mas pode ser que ela fique circulando apenas entre círculos de amigos. Precisamos estar ligados na internet sabendo que a direita está também atuando firmemente nas redes sociais tanto para divulgar suas ideias quanto para vigiar a esquerda.