Ele foi demitido da presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) por discordar da política econômica do governo Lula em 2004.
Nacionalista, Carlos Lessa, 73 anos, professor aposentado da Universidade Federal do Rio de Janeiro, é um dos economistas e intelectuais mais respeitados do país.
Em entrevista exclusiva ao Unificados, Lessa fala sobre as mudanças na Lei do Petróleo.
Mudanças
O governo encaminhou ao Congresso, em 31/08, projetos de lei que mudam o marco regulatório do petróleo. Se aprovados, a exploração do pré-sal será feita através de um modelo misto: concessão e partilha.
Hoje, no sistema de concessão, a empresa vencedora da licitação é dona de todo o óleo extraído. Na partilha, que será feita em cerca de 72% da área do pré-sal (ainda não leiloado), o óleo é dividido entre a União e empresas que derem a maior parte do petróleo ao Estado.
A estimativa é de reservas entre 9 e 14 bilhões de barris, quase o dobro das atuais.
O mapa do petróleo
Mapa da localização dos poços do pré-sal no litoral
brasileiro (Editoria de Arte-Folha Imagem)
Maravilha ou maldição?
Unificados – O que significa a mudança do marco regulatório para exploração do pré-sal?
Carlos Lessa – O que foi anunciado até agora é um retorno à visão do interesse nacional sobre o interesse privado. Ou seja, é uma derrota da visão neoliberal. O que o governo federal fez foi muito correto.
Em primeiro lugar, colocou a Petrobras presente em todos os lotes do futuro pré-sal, com 30% em troca do pioneirismo dela. Corretíssimo.
Segundo, trocou o regime de concessão pelo regime de partilha nos novos lotes. Continua o péssimo regime de concessão fora do pré-sal e nos lotes do pré-sal já leiloados. Mas o grosso do pré-sal vai ser dividido em partilha, muito mais conveniente pro país.
A outra coisa extremamente importante é que houve a decisão de capitalizar a Petrobras com R$ 100 bilhões de ações. Decisão, ao meu juízo, corretíssima, que é atribuir um valor elevado, US$ 10 por barril potencial, às franjas dos atuais lotes concedidos, com o capital à Petrobras. Eu acho isso uma maravilha porque o governo, na verdade, vai entrar com os direitos de explorar o petróleo na periferia dos lotes atuais. (…) Porque tem uma coisa é o roubo do petróleo: se o campo é contínuo e a concessão não cobre o campo todo, na franja é possível tirar petróleo do campo principal. E o que o governo fez foi capitalizar a Petrobras, transferindo como capital para a Petrobras ter seus direitos nos territórios limítrofes. Isso me parece extremamente inteligente porque vai criar um anel de Petrobras em torno desses lotes que foram irresponsavelmente leiloados no passado.
O que me preocupa é: se o Brasil quiser ser uma economia robusta, tem que usar o petróleo para ficar forte e não para exportar petróleo cru, porque isso é a pior opção de todas. Quanto mais eu estou transformando, mais eu estou colocando valor nas coisas.
Pegar petróleo e jogar fora para o resto do mundo é uma estupidez. Países que exportam petróleo são países amaldiçoados. No limite pode ser um Iraque. Ou Kwait. Ou uma Arábia Saudita. Tudo é ruim. Só tem um país que exportou petróleo com inteligência: chama-se Noruega.
Unificados- Lá o sistema é de partilha.
Carlos Lessa– Isso que o governo anunciou é muito inspirado no norueguês. Agora a imprensa vai bater pesadamente. Os lobbistas do setor já estão todos nos jornais hoje dizendo que se está retrocedendo, reestatizando… É uma coisa terrível. Mas com petróleo não se brinca, viu? Eles vão jogar tudo contra, para derrubar a lei. E a desculpa que eles vão usar é a questão da partilha. Você é paulista e eu sou carioca, mas nós temos que partilhar todo o rendimento do petróleo com o Brasil todo. Por quê? Porque é uma riqueza da Nação. Não é riqueza só do morador de Copacabana, meu bem. Estão tirando petróleo a 200 quilômetros de Copacabana, mas Copacabana não tem nada a ver com isso. Só tem tudo a ver porque faz parte do Brasil.
Unificados – O que representa o pré-sal para o país?
Carlos Lessa – O futuro. Que idade você tem, menina? Não tem filho ainda. Mas vai ser vovó, né? E o seu neto vai viver numa civilização muito diferente se nós o utilizarmos bem. Se nós utilizarmos mal, seu neto vai levar uma bomba dirigida na cabeça dele quando for garoto.
Como os recursos devem ser investidos?
Carlos Lessa – Obviamente um pedaço dos recursos deve ser investido em infra-estrutura. Nós estamos precisando muito de eletricidade e desesperadamente de ferrovias. E a outra coisa que é extremamente importante é que a gente toque para frente políticas sociais. Finalmente é possível fazer uma política educacional bem feita, cobertura de saúde, segurança… É para o Brasil uma maravilha, se nós utilizarmos bem. Mas é uma maldição se nós utilizarmos mal.
Unificados – A gente já pode dizer que o pré-sal é nosso?
Carlos Lessa – Ainda não. O alto preço da liberdade é a vigilância, né? (…) O Lula está acertando com o petróleo, mas, com a China, ele fez um negócio com muito lucro chinês. Trocou 10 bilhões de óleo cru por um financiamento chinês à Petrobras. A Petrobras não precisa de financiamento internacional, de um ou outro país. A Petrobras é ouro em pó: ela consegue o financiamento que ela quiser.
O Brasil já tem auto-suficiência de petróleo. O que o Brasil precisa é de industrialização. E a economia do petróleo bem manejada leva o Brasil à industrialização: à multiplicação dos empregos de boa qualidade.
“O petróleo tem que ser nosso” – Assista documentário e leia cartilha
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Para ver o filme, acesse:
http://www.apn.org.br/apn/index.php?option=com_content&task=view&id=1215&Itemid=71
Para ler a cartilha, acesse:
https://www.quimicosunificados.com.br/arquivos/2011/03/pw_-_cartilhasindipetro_-_2009.pdf