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ENTREVISTA: Riscos da nanotecnologia na saúde do trabalhador são desconhecidos

Nanotecnologia é a criação, manipulação e exploração dos materiais na escala nanométrica. Para se ter uma ideia, um nanômetro é um metro dividido por um bilhão.Esta ciência, que pesquisa partículas em escala muito pequena, não para de descobrir novas propriedades e possibilidade de aplicação na produção de diferentes produtos: pneu que não fura e embalagem plástica altamente antiaderente, por exemplo.

No entanto, é preciso estar alerta a este mundo de maravilhas tecnológicas. Os impactos da nanotecnologia na saúde dos trabalhadores ainda são desconhecidos. Por isso, a Fundacentro (Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho) e sindicatos de trabalhadores nas indústrias químicas e farmacêuticas têm promovido debates sobre este tema.

Segundo a pesquisadora da Fundacentro Dra. Arline Sydneia Abel Arcuri (foto acima), há investimentos pesados por parte das empresas e governo nas pesquisas aplicadas à nanotecnologia. Por outro lado, praticamente não existem investimentos em pesquisas voltadas aos impactos na saúde dos trabalhadores que manipulam nanopartículas.

O Jornal do Unificados entrevistou a Dra. Arline.


Direito à informação: é preciso saber se
a empresa utiliza esta nova tecnologia

Unificados – Nanomateriais são produzidos a partir de nanopartículas. O que se sabe a respeito da penetração delas no organismo humano?

Dra. Arline – As nanopartículas, dependendo de suas características podem penetrar facilmente no organismo por todas as vias: respiratória, pele e via digestiva. Mas pode, já no nariz, através do nervo que faz com que a gente sinta cheiro, ir direto para o cérebro.

Unificados – Quais são os riscos que a nanotecnologia pode trazer à saúde dos trabalhadores na indústria química, por exemplo?

Dra. Arline – Ainda são pouco estudados os riscos que o material obtido intencionalmente pelas nanotecnologias pode provocar na saúde dos trabalhadores. Estudos com nanopartículas produzidas pela atividade humana, como as que se formam na combustão de óleo diesel, já têm sido relacionadas com aumento de doenças e mortalidade por problemas cardiovasculares. Vários fatores de risco de doenças cardiovasculares foram associados com a exposição às partículas no ambiente, como por exemplo: elevação da frequência cardíaca, diminuição da variabilidade da frequência cardíaca, vasoconstrição arterial, pressão arterial sistólica aumentada, e aumento da viscosidade plasmática. Estas alterações podem resultar em consequências negativas para a função cardíaca, especialmente em pacientes com doença cardíaca isquêmica, arritmias cardíacas e insuficiência cardíaca congestiva.

Unificados – Já houve algum registro de caso de contaminação por nanopartículas?

Dra. Arline – Eu pelo menos até agora só vi uma notícia: sete jovens chinesas sofreram danos permanentes aos pulmões e duas delas morreram depois de trabalhar durante meses, sem proteção, numa fábrica de tintas que usava nanopartículas, informam cientistas chineses. Eles afirmam que o seu estudo é o primeiro a documentar malefícios causados por nanotecnologia na saúde humana. Testes com animais já haviam mostrado o risco das nanopartículas para os pulmões de ratos, conforme noticiado pelo portal do jornal O Estado de S. Paulo, em 2009.

Unificados – Existe diferença na forma como esta tecnologia é utilizada por outros países?

Dra. Arline – Em outros países, especialmente estados Unidos, Japão, União Europeia e China, estas tecnologias estão bem mais adiantadas tanto em conhecimento na área como em relação à produção. Mas, aparentemente, pelo que temos lido a respeito, vários países tem apresentado dúvidas quando aos riscos destas novas tecnologias.

Unificados – Quais as mudanças que essa tecnologia traz ao setor produtivo? E nas relações de trabalho?

Dra. Arline – Diversas ocupações deverão ser extintas e outras novas deverão ser criadas. Novos produtos deverão exigir novos processos de produção. Deve crescer a informatização e robotização, assim como a vigilância nos ambientes de trabalho. Nas relações de trabalho estas mudanças deverão exigir mais capacitação dos trabalhadores. E, com isto, também muito maior competição, o que certamente traz efeitos complicados nas relações entre os próprios trabalhadores.

Unificados – Do ponto de vista da saúde e segurança, houve alguma ação de proteção para inserir esta tecnologia na produção industrial?

Dra. Arline – Desconheço se alguma empresa utiliza ou pensa em utilizar alguma proteção específica, pelo menos no Brasil, para produção de materiais nanoestruturados. No projeto que desenvolvemos na Fundacentro temos visitado algumas empresas e não vimos nada de diferente. Na verdade, não é fácil conseguir visitas às empresas. Mesmo o NIOSH (Instituto Nacional de Saúde e Segurança Ocupacional, dos Estados Unidos) que é uma entidade de pesquisa na área de saúde e segurança do trabalhador ainda não fez normas para isto, apenas recomendações.

Unificados – E quanto ao meio ambiente?

Dra. Arline – A mesma coisa. Já há produtos no mercado e nem sequer há regulamentação com relação a rotulagem para que seja indicado no produto se há ou não nanomateriais.

Unificados – O que está ao alcance dos trabalhadores para protegerem-se dos possíveis impactos nocivos da nanotecnologia?

Dra. Arline – Acredito que a primeira coisa é saber que suas empresas estão utilizando estas novas tecnologias. Depois, exigir que não haja possibilidade de que sejam expostos até terem certeza de que estas exposições não poderiam causar efeitos indesejáveis à sua saúde.

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